Após décadas de domínio, as hidrelétricas caminham para perder o protagonismo na matriz elétrica do Brasil, onde a acelerada expansão das usinas eólicas e da geração solar fotovoltaica deverá levar a mudanças importantes na operação do sistema elétrico ao longo dos próximos anos.
Se antes o suprimento de energia era assegurado por reservatórios hídricos com capacidade para suportar até anos de consumo, agora parte crescente da oferta está associada ao sol e ao vento, que variam fortemente durante o dia, disse à Reuters o diretor-geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), Luiz Eduardo Barata.
Em meio a essa nova realidade, o órgão que gerencia o acionamento de usinas de geração e o uso de linhas de transmissão para garantir o suprimento elétrico do país tem buscado ferramentas para lidar com a incerteza associada à produção dessas novas fontes renováveis.
O ONS desenvolveu um aplicativo que utiliza dados de previsões de vento fornecidos por instituições especializadas para projetar a geração das usinas eólicas, e um sistema semelhante está sendo criado para permitir previsões também sobre a produção dos parques solares, que começam a ganhar espaço no país.
“Temos percebido um aumento da volatilidade. É uma mudança enorme em relação aos tempos passados, quando a matriz era basicamente hidrotérmica”, disse Barata, que prevê que o sistema de projeções solares esteja operacional em dois anos.
“A gente, com isso, já antecipadamente sabe mais ou menos que providências têm que ser tomadas no sistema, de forma a compensar (a variação da geração eólica e solar)”, acrescentou.
Projeções do governo no mais recente Plano Decenal de Energia, com diretrizes para expansão do setor elétrico até 2027, apontam que hidrelétricas devem ver sua fatia na matriz cair para 51% no período, contra 64% em 2018, enquanto fontes alternativas, principalmente eólicas e solares, devem saltar para 28%, de 22% atualmente.
As usinas hídricas já chegaram a representar mais de 80% da capacidade do Brasil nos anos 80 e 90.
Mas dificuldades no licenciamento ambiental que ajudaram a reduzir o ritmo de construção de hidrelétricas ainda fizeram com que os novos empreendimentos da fonte fossem construídos principalmente sob o modelo “a fio d’água”, sem reservatórios, o que reduziu a chamada “capacidade de regularização” do sistema.
Só entre 2005 e 2017, a capacidade dos reservatórios hídricos de atender à demanda mesmo em cenário crítico de chuvas caiu de 27 meses para 16,4 meses, segundo cálculo do centro de estudos Acende Brasil.
“Esse é o tema mais importante, na minha opinião… é uma dádiva termos construídos todos esses reservatórios no passado, senão a entrada das eólicas seria quase impossível”, disse o professor Adilson de Oliveira, do Grupo de Economia da Energia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (GEE-UFRJ).
Fonte: Agência Reuters